No Outro Lado!





Era noite cerrada quando se decidiu! Não lhe apetecia estar em casa, e achou que era uma hora como outra qualquer para sair e dar uma volta. Não contara com a chuva, que o apanhou já longe e obrigou a procurar abrigo num vão de escada, daquela viela escura.
Acendeu um cigarro e encostou-se de forma a não se visto por quem passasse. Aquele, não era um lugar agradável, principalmente, numa noite escura e chuvosa como esta.

Foi, ao acender o segundo cigarro, que reparou em algo estranho que até aí lhe passara despercebido; a porta, lá ao fundo do seu lado direito estava entreaberta, o que lhe aguçou a curiosidade. Enquanto se movimentava silenciosamente na sua direcção, pensou, que provavelmente não encontraria ninguém, quanto muito, algum janado, que teria ali encontrado refúgio para a ressaca.

Entreabriu a porta, com mil cuidados para que não rangesse, espreitou, e viu uma sala pequena e nua com quatro portas de diferentes cores. Certificou-se não existir nada nem ninguém na sala, e entrou para um pequeno e exíguo espaço. Ficou admirado, quando uma das quatro portas, a amarela, se abriu num convite. Com a curiosidade a empurrá-lo, aproximou-se. Já na soleira, tentou perscrutar o interior dando um passo em frente para ver melhor, quando, a porta de súbito se fechou e num segundo a sala ficou inundada de luz dourada, tão forte que o obrigou instintivamente a cerrar os olhos.

Incrédulo, notou que já não estava na saleta... Estava agora, bem no meio de um campo dourado de trigo, extenso, até onde a vista alcançava.
Percorreu-o, em vão, durante o que lhe pareceram horas, à procura de uma saída, mas a porta por onde entrara desaparecera sem rasto, e a paisagem tinha começado a mudar, já cansado, aproveitou para beber daquele braço de água que serpenteava a paisagem. Saciada a sede, sentou-se na convidativa sombra de um imenso cipreste que casava com a margem do ribeiro, adormecendo profundamente.

Acordou, com o frio da água que lhe molhava a cara, e em pânico verificou que o ribeiro tinha coberto toda a paisagem e o arrastava para longe. O cipreste, onde tinha descansado, já se não vislumbrava, tudo à sua volta era um mar imenso.
Sentiu que a água ganhava uma consistência viscosa e se enrolava ao seu corpo como uma serpente, lutou para nadar dali para fora, porém, não via como, a paisagem era toda mar e as suas cores mudavam a cada minuto, sentiu-se terrivelmente desconfortável quando a água se avermelhou e lhe pintou os olhos, tentou limpá-los, mas os braços não obedeceram. Fez um derradeiro esforço, cerrando-os furiosamente para os abrir num repente, e foi, quando, viu uma parede branca junto a si.
Bem ao longe alguém chamava o seu nome, redobrou então, a vontade de alcançar a parede branca na esperança de se agarrar, e ouviu de novo, agora mais perto: Bernardo! Bernardo... Era o seu nome proferido com evidentes sinais de ansiedade. Pareceu-lhe a voz de Luciana. Tentou erguer a cabeça acima da água viscosa que o abraçava, quando a ouviu com nitidez dizer: Não te mexas Bernardo, os paramédicos já te estão a meter na ambulância.
Só então, Bernardo se lembrou daquela curva que a sua mota não fez.

Espreitador

14 comentários:

Ipslon disse...

pois pois senhor pires! um truque todo giro para nos recambear para o novo blog, n e?!
faz bem, faz! ja leio o resto...
entre tanto espero que continue a por os contos inteiros aqui, que ficar com os contos a metade faz mal! parece qe ficamos engasgados enquanto o computador n carrega a pagina nova.

Ipslon disse...

Oh meu deus!
senhor Pires! Excelente! E que nem tenho palavras. Agora sim estou convencido de que consegue publicar um livro!

“consistência viscosa e se enrolava ao seu corpo ” so de ler isto fiquei agoniado. E eu so sinto o que o personagem sente quando está realment bem escrito.

A colherada vai para o blog em si (a rua dos contos). A letra e excessivament pequena, visualment e incomodativo…

de resto
Francamente genial.

Anónimo disse...

E de deixar qualquer um com pensamento a mil!!!
Show de texto!

Sempre inovando né Sr. Pires!!!

Abração!!!!

Rui Martins disse...

Olha a estreia do blogue de contos... Discreto e eficaz!

Vespinha disse...

Olá!
Venho deixar-te uma beijoca gorda e desejar-te um Feliz Ano de 2006!!

Vespinha

Intervencionista disse...

Está aprovado "velhote"... espero é que depois ainda tenhas tempo para dar atenção à familia :)

Parrot disse...

Piref,

Foi um prazer descubrir-te em 2005.
Um bom ano de 2006.

Abraço Amigo

Ado, il Navigatore disse...

Amigo Espreitador,

passava para desejar-te um feliz ano novo, mas ao ler este último conto, esqueci do que vinha dizer: então que em 2006 venha o teu livro! E que saia impresso aqui no Brasil! E que eu possa lê-lo, devorá-lo!

Feliz 2006 amigo!
Abraço.

Desambientado disse...

Deixei mensagem no fim da linha. Gostei da história até ao fim.

Aqui, e além, ficam os votos de um excelente 2006.

Meia Lua disse...

Muito bom o teu texto!!!
descreves tão bem as sensações, até parece que já estiveste numa situação assim... sempre a surpreender!
Desejo-te um 2006 cheio de idéias brilhantes para que cada vez mais continues a "encantar" com os teus contos :)
beijinho

Nina disse...

Querido amigo, fiquei muito emocionado com as belas palavras que me dedicou! Passo por aqui pra desejar um Feliz 2006!!
Que nossa amizade dure por muitos anos... =]

AJBA disse...

Para o grande amigo PF que 2006 lhe conseda mais tempo para aquilo que ele sabe fazer...escrever e escrever.
Quanto a publicar os contos...todos os que o conhecem na vida real e via blog é obrigatório enviarem em € ou outra moeda para abertura de conta na Suiça (onde Pires se vai deslocar em meditação).
Que tenhas muita saúde depois para gozar tudo e nós a vermos.

um abraço
AJA

Anónimo disse...

best regards, nice info » »

Anónimo disse...

That's a great story. Waiting for more. trademark attorney stationery Car bingo