Não existem limites para os nossos sonhos, basta acreditar!

A ti, que por aqui continuas teimosamente a passar, desejo-te um maravilhoso Natal. Um Natal de retemperação.
E, se tiveres de correr por algo, que seja pelo amor e sua eterna força, pela raiz vibrante da paixão que desagua nas palavras que estão dentro de ti, pela alegria de um coração a dançar, pelas pessoas que te gostam de ver rir, pelo doce de um beijo, pela saudade daquele abraço que te forra a memória e escorre qual rio, pela paz de uma paisagem de mil cores no meio do nada, por uma lágrima da lua, o perfume da rosa ou a cor do mundo que se dá, que se revela na sua verdade com um sorriso de esperança.

Para 2009, faço votos para que te consigas livrar daquelas acções de desmedida e mentirosa tendência que ninguém quer, que saibas rir quando te falarem da fereza da competitividade, que não te chegue aquele vendaval que dá pelo nome de crise e fabrica demónios de carência, que passes ao lado dos downsizing de fronte alheada e vaga e tenhas mesa farta e um pote de ouro no recôndito do teu lar, que nunca conheças a sanhuda face do outsourcing ou a dos recibos verdes e, finalmente, que as reduções de custos e a maldade milenta das habilidades sinergéticas, as leve o ermo vento como sombras do passado.

Boas festas e que o cérebro te inche de novas e boas ideias.

Já não existem álamos, nem luas, nem métricas que me valham.

A mão está pesada… e a pena, véu de alma transparente já não me embala, nada surge neste descansar de nada… não escalo montanhas, não atravesso oceanos, tão-pouco enfrento tempestades, e pergunto-me no desalento, no desencanto, na tristeza esparsa sem nenhum motivo de pranto, para onde foram as palavras?…
Que fiz dos infindos tesouros recolhidos e guardados na pele… onde se recolhe o mistério do imaginário quando desaba o silêncio sobre os crepúsculos negros de tristeza que misteriosos me rodeiam e porque quero tanto o que ninguém me pode dar?
Chove e interrogo-me na tarde lívida se a tristeza das gotas que caiem será minha, que sabor será o do grito que expressa sentimentos e teimo em calar, e quantas serão as palavras nuas de diferentes paladares que se debruçam a poemar.
Mas para quê interrogar-me? Não sei que fazer com as palavras que transporto neste tempo de horas certas em tempo que não é certo e onde os ângulos se não encaixam, da pressa para tudo até para não se ter pressa dos dedos entrelaçar no calor necessário de um ombro amigo no qual chorar… resta-me lamuriar por ser tão como os outros, tão singular.
Olho pela janela em busca da luz que se reflecte nos sorrisos, dos passos que dançam tangos de olhos unidos até cegar, da mágica brancura dos sentimentos cristalinos, das sombras esbatidas que se abraçam num poema ou na ternura de um olhar, do dia em que nas minhas mãos sentirei o sentido das tuas como palavras nuas que não poderei calar, da bússola, de um mapa, de um paralelo dobrado num qualquer canto de luar…

A chuva parou, e o céu, devagar, mesmo devagarinho, sem pressas, seguindo o seu caminho, abriu um sorriso único… eis então que a página, incontida se moldou, e subindo às palavras de azul se manchou.

Apanhado com mirabolante facilidade na teia da loucura.

A mulher que rondava os trinta anos gritava para quem a queria ouvir que, aquele ali, apontando um indivíduo dos seus quarenta com ar de redfish baratuxo, era um patife. - Enganou-me, gritava, e enquanto puxava pela mão de uma rasteirinha de olhos arregalados, continuava: - E agora este merdas nada quer dar para a criança, nem sequer o nome. Bandido! Filho-da-puta!…
Os curiosos que se tinham juntado para assistir ao desacato, possuídos daquela facilidade que nos caracteriza em tomar partido sobre qualquer polémica, davam a sua contribuição condenando já o homem, a maioria, dizendo que há gajos que são uns bandidos, querem é dar uma queca mas depois não assumem a responsabilidade, outros, defendendo que a criança não tinha culpa dos erros dos adultos e, era imoral, no mínimo, não ter o nome do pai. Tudo isto dito de forma sintética e desengordurada.

O alvo da confusão estava estupidificado; ora olhava a mulher, ora olhava as pessoas, sabendo estar metido numa grande alhada. Por vezes, nos milimétricos silêncios tentava dizer qualquer coisa, mas logo a mulher teimava em lhe estragar o encanto das palavras berrando-lhe a plenos pulmões que ele era um bandido, que a tinha enganado, que as havia de pagar, que a mãe bem a tinha avisado… Tudo isto numa gritaria tal -como se lhe despejassem em cima calhaus a ferver, que se ouvia de uma ponta a outra da Gare do Oriente.

Não cheguei a saber para quem ficaram os méritos e os deméritos, ou tão-pouco quem arcou com a fúria daquelas gentes, embora, o alvo, fosse mais óbvio do que a boa música ter a ver com o “soar bem”, não assisti ao resto da discussão, não sou grande apreciador, estas apertam-me o peito e causam-me tal ansiedade que me leva directamente à cerveja, por isso fui andando.
Enquanto me afastava, continuei a ouvir os impropérios da mulher que sobressaíam do vozear da multidão que ia engrossando à volta dos desavindos.

No dia seguinte, fazendo o mesmo percurso, reparei ainda de longe que havia outra confusão precisamente no mesmo local. Enquanto me aproximava, reconheci os gritos da mulher que gritava a plenos pulmões os mesmos impropérios da véspera; que ele era isto, que ele era aquilo, que não dava nada à criança… e os curiosos à sua volta, tal como antes, tratavam de tomar partido e dar a sua opinião.

Tudo igual ao que tinha visto no dia anterior com um pormenor que fazia toda a diferença e tornava cândida qualquer tese que tivesse desenvolvido. Incrédulo, avancei para me certificar e constatar sem sombra de dúvida que este era mais forte e mais novo que o outro, até mais alto, este homem, era óbvio, nada tinha a ver com o redfish baratuxo de ontem.

Saí dali a correr, pelo caminho, sorridente, dei uns pontapés na fronteira artificial dos moralismos que ontem se tinham encavalitado, sabia que já me esperava um arroz de lingueirão com jaquinzinhos fritos.

Nota: Conto revisto e republicado porque sim.