Um Natal diferente
O nascimento de uma nova galáxia tinha-me levado a apresentar a autoria de um novo projecto à divisão de conceptualistas. Não esperava uma recusa nem a directiva vinda da Gerousía do Conselho de Quadrante: tinham sido detectados por um novo Espreitador de Paralelos, num dos mundos sob a minha supervisão, vários erros à trajectória humanista traçada. A minha missão e dela dependia a concepção do novo projecto, consistia em inverter as tendências verificadas. Na posse dos dados, conclui, que o problema não era de concepção. Tudo não passava de uma questão desviante, uma neoplasia provocada pelo posterior nascimento de três luas no quadrante inferior que provocara uma alteração geoquímica, fazendo com que, a tecnologia que lhes fomos induzindo através da ciência, não os tivesse invadido apenas exteriormente mas também nos seus domínios interiores. Isto, que antes me parecera de somenos, obrigara-me a esta viagem para ordenar o vaivém dos seus actos, mesmo os mais medidos, mesmo os mais falhados.
No interior de uma casa de comida na baixa de Lisboa, observava através da divisória de vidro e protegido dos olhares apressados, a azáfama deste mundo sem compreender como podiam os humanos ser desprovidos da ventura de sentimentos solidários. Haviam-se transformado em neo-individualistas. Pensei na estratégia a adoptar para os reconduzir à trajectória inicial. Estávamos a poucos dias de celebrar uma importante data para eles, o natalis invicti solis, uma celebração de vida e humanidade que derivava do dies natalis solis invicti que havia sido traçada pela Gerousía, e não obstante os desvios verificados, continuavam a festejar. Observei também, que nem todos o faziam da mesma forma nem na mesma data e que muitos já não o celebravam, motivo adicional de preocupação. Todavia, a solução apresentava-se fácil e tinha alguns dias para preparar a indução de um mundo humanista. Esta faria com que vivessem na trajectória espectável da sua concepção.
O plano estava traçado, era tempo de apresentar os meus empenhos à Gerousía.
Sorri pensando no prazer agradável de conviver com eles estes dias. Tinham o hábito da comida e os aromas que sentia naquela casa, contribuíam decisivamente para querer permanecer mais algum tempo neste mundo. Talvez tivesse sido o que me levou a pensar na extensão do plano a que chamei de Neo-Natal e que consistia em doses massivas de auto-exames de consciência. A indução duraria até ao segundo dia do novo ano solar, depois seria retirada e os humanos regressariam ao seu estado habitual, todavia, com o lastro da memória desses dias. Queria assistir ao que fariam com ela.
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